Looking Asa Sul, feeling Asa Norte

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A bem dizer, estou no buraco do tatu. Bem no meio, no epicentro de Brasília, entre a Asa Sul e a Asa Norte. Me mudei de lá para cá tem três dias – e eu, que adoro primeiras vezes, estou vivendo intensamente minha primeira vez na Asa Norte.

Mudar de bairro é tão legal quanto mudar de cidade, só que mais confortável: você muda verdadeiramente de ares sem o inconveniente da readaptação. Você sabe onde tem tudo, nunca se perde, mas está sempre se surpreendendo com pequenos detalhes.

A padaria diferente, o empório em que nunca tinha reparado, um ritmo mais pausado, uma gente que parece menos de passagem. E uma surpresa de primeira hora: vizinhos.

Há três dias não paro de colecionar pessoas. Um vizinho do terceiro andar convidou meus filhos para serem amigos dos filhos dele. A Rose, minha vizinha da frente, fez questão de trazer o gato dela para conhecer o meu logo que soube da existência do Skate, nosso delicioso vira-lata. O vizinho do lado é o seu Moisés, que não economiza sorrisos, e no segundo andar tem um casal de velhinhos que se apresentou para mim e para as crianças como “a vovó e o vovô do segundo andar”.

Já sinto falta das árvores densas, de vagar pela sua W3, de morar a dois passos da Igrejinha – mas lamento admitir, Asa Sul: não me lembro ter recebido de você tão calorosas boas-vindas.

Meu medo é só que elas sejam tão efusivas quanto breves – e que resistam apenas até que o primeiro grande open-house nos separe. (Mas espero que não.)

É melhor tombar o bom senso do que a cidade

transverso

A tirar pelo descaso de quem foi eleito e de quem manda, o tombamento de Brasília já não vale grande coisa. É puxadinho daqui, destruição dali, e lá se vai (não sei pra onde) o projeto modernista e romântico da capital. Lindo e ingênuo como todo romântico.

Se ninguém consegue fazer cumprir o tombamento da cidade, deve ser porque ela é grande demais, né. Ninguém consegue manter a ordem de uma ponta a outra do Eixão, é pedir muito. Então venho por meio desta propor ao Iphan e ao GDF mais liberdade poética ao tombamento. Quem sabe eles dão conta?

Pelo tombamento do bom gosto! Quem transformar um prédio modernista num banheiro de quinta terá de pagar multa em prol de uma escola, a ser construída, de ensino obrigatório da disciplina: “O que é patrimônio público? O que é Brasília? O que sou eu?”.

A regra é retroativa, ou seja, os responsáveis por aquele portal greco-romano na entrada do Pontão não irão se safar dessa.

Pelo tombamento do bom senso! Quem desfigurar o gramado central da Esplanada com obras faraônicas, quem colocar uma cerca em volta do Congresso como se ali fosse o quintal de sua casa, quem autorizar uma propaganda bizarra de refrigerante ser o monumento de boas-vindas à cidade: pena de 10 anos de férias em outro planeta. Qualquer um, menos a Terra.

Por fim, pelo tombamento do bom humor. Quem reclamar de Brasília, do trabalho, da vida, por mais de 7 dias consecutivos e não fizer menção a qualquer mudança será enviado para outra cidade, ou para outro trabalho, ou para outra vida. O objetivo é que a perspectiva lhe inspire alguma coisa.

É isso. Vamos rir das nossas desgraças, mas sem deixar de levá-las a sério.

Foto: Coletivo Transverso.

Ela pode ser do Brasil, mas continua Consuelo

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Toda vez em que alguém fala do retorno triunfal de algum artista desaparecido há décadas, me dá um arrepio na espinha. Quanto mais importante a história do artista, maior a chance de o retorno ser um fiasco – esse é o meu pessimismo da pior qualidade.

Baby do Brasil ressurgindo das cinzas? É marketing, é moda, é roubada. É coisa da Paula Lavigne, ô mulher que sabe ganhar dinheiro. Baby do Brasil, aquele arraso de cantora que virou pastora evangélica? Ah não, não é possível que vão tentar ressuscitar uma Baby que não existe mais.

Corta a cena e lá estou eu, de frente para a Baby, no show que ela apresentou no Vivo Open Air, em maio. Lá estou eu quebrando minha cara, perdidamente apaixonada por ela, a pastora pop, que não ressuscitou porque nunca morreu. Hoje é do Brasil, mas continua sendo Consuelo, linda, louca e roqueira. O cabelo ainda é roxo, só o grito de guerra que mudou. Antes era “Rá!”, agora é “in name of Jesus!”.

O show é um culto sim, mas à boa música: a voz continua poderosa e afinadíssima, o repertório é incrível e a banda, liderada pelo seu filho, é demais. O único momento em que a pastora surge no palco é quando Baby conta como aceitou fazer um show sem música gospel. “Deus deixou”, diz ela.  “Obrigado Deeeeus!”, grita alguém da plateia.

Melhor momento: quando a cantora conta como ela e Pepeu foram impedidos de entrar na Disney. Esse episódio maravilhoso rendeu a música “Barrados na Disneylândia” e me fez perceber o quanto fui boba. Alguém que já foi barrado na Disney porque tiraria a atenção do Mickey merece o meu respeito eterno. Alguém assim não iria me decepcionar.

Bora?
A Baby está de volta a Brasília e faz show neste domingo (25), de graça, na praça do Museu da República.
(A leitora Andrea me corrigiu a tempo: o show faz parte do projeto Todos os Sons, do CCBB, mas o show é no museu, ok? Obrigada, Andrea!).
O projeto começa às 17 horas. Antes da Baby, tem dois shows: Jibhajan (Concerto de Música Brasileira para Crianças) e Passo Largo, de música instrumental.

A Cena (e seus filhotes)

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Tenho só duas coisas para dizer sobre o Cena Contemporânea, o festival que transforma Brasília num palco aberto de teatro durante uma semana e meia.

A primeira é que ainda tem ingressos. E que são vendidos pela internet. Ou seja: não há desculpas. Escolha um espetáculo, compre e vá. Simples assim.

A segunda é que o Cena deu cria. Associada ao festival acontece o FIIM, Festival Internacional de Interação Multimídia, que como o nome indica pretende reunir criativos de novas mídias em formações e espetáculos – e Brasília só tem a ganhar com isso.

É verdade que quando a gente fala em “novas mídias” é difícil ter uma ideia exata do que se diz – tem compositor de música eletrônica, militante do software livre, gente refletindo sobre a cultura do remix, uma turma que trabalha com videogame…

É muita modernidade pra você? Pois te digo que essa salada vai ser divertida. Dois exemplos. Na sexta-feira acontece, na Praça dos Três Poderes, a intervenção Brasília Invaders, que promete transformar as torres do Congresso nos famosos atiradores do jogo Space Invaders, muito conhecidos por quem tem (bem) mais de trinta. Será que é algo parecido com isso? Fico na torcida, pois é produzido pela mesma turma, o MidiaLab, da UnB.

Outra boa notícia trazida pelo FIIM é que, também na sexta, rola Aparelhinho na rodoviária do Plano Piloto. Ah, Aparelhinho, é tão difícil te definir… Mas quem precisa de definição? A gente quer é dançar a correr atrás do nosso monstrengo musical do coração.

Bora?
Cena Contemporânea
Festival internacional de teatro, que acontece até dia 1o. de setembro em vários espaços culturais da cidade.
Programação completa aqui.

FIIM – Festival Internacional de Interação Multimídia
Música eletrônica, video-game e modernidades afins
Programação completa aqui.

PS: Confesso que, tirando a onipresença do sistema Criolina e o show do Móveis, a programação musical do Cena deste ano não me emocionou. Mas se você curte Baby do Brasil, GOG ou ficou curioso pelo resto, clica aqui.

Olhar sensível, fala sensível

daniela cadena

Tenho uma teoria 100% não científica e sem qualquer compromisso com a realidade, mas que faz total sentido pra mim: se você se interessa pelas fotografias de uma pessoa, você vai se interessar em conversar com ela. O contrário também vale: se a conversa de alguém te inspira, dê uma olhadinha no instagram dela.

O olhar, o pensamento e a fala são tão conectados, pra mim, que ouso atestar essa teoria como verídica. Mas como em toda teoria, as exceções são várias, claro: malas que são ótimos fotógrafos ou pessoas superinteressantes que não conseguem tirar nem foto 3×4. Acontece, mas é a exceção (segundo a minha teoria). Então vamos focar na regra.

Hoje é Dia Mundial da Fotografia. Melhor seria dizer que hoje é Dia do Olhar. Algum grande fotógrafo de quem não lembro o nome disse que uma boa fotografia não se faz com equipamentos caros, efeitos complexos e conhecimentos técnicos, mas sim com o olhar.

É na sensibilidade que mora uma boa imagem: aquela que não só ilustra, mas te diz efetivamente alguma coisa importante. E assim são as pessoas: algumas só figuram, compõem a paisagem. Outras acrescentam.

Isso tudo pra dizer que, se você acreditar na minha teoria, vai querer ouvir os fotógrafos que participam de debates a partir de amanhã, no Brasília Shopping. As discussões fazem parte da exposição “Brasília. Monumento a Céu Aberto”, que abre hoje com coquetel às 19 horas e fica até o dia 15 de setembro.

Já conversei pessoalmente com a maioria deles, e isso me faz concluir que, apesar das exceções, a regra se mantém. Olhar sensível, fala sensível.

Bora?
Brasília. Monumento a Céu Aberto
Exposição de fotos (1º piso do Brasília Shopping) e talk shows semanais (das 19h às 21h30, no Teatro Brasília Shopping).
20/08 – Patrick Grosner e José Maria Palmieri
26/08 – Daniela Cadena e Lula Lopes
03/09 – Joana França e Diego Bresani
09/09 – Vitor Shietti
Perfil dos fotógrafos: aqui

Essa foto aí de cima é da Daniela Cadena, que já passou por aqui.

Amanhã eu quero ser duas – não, três

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Tá tudo combinado:

Amanhã eu acordo, vou para o Catetinho com as meninas da Tríade, volto, almoço no Picnik, badalo na feirinha, deixo os meninos na brinquedoteca (porque nessa edição tem), saio, vou pro Museu da República, assisto um montão de espetáculos maneiros do mundo todo, volto pro Picnik, porque afinal de contas todo mundo vai estar lá e certamente vai ter uma coisinha que eu vou ter ficado com vontade de comprar e não vou ter comprado na hora, né?, pra não comprar por impulso, daí como mais alguma delícia por lá, fico com peso na consciência pensando nas lindezas que devem estar rolando no Museu, volto pro Festival, daí a essa altura eu vou estar morta e precisando de uma ioga – lembro que vai rolar uma ioga a luz de velas no Picnik!, corro pra lá – aproveito pra ver o show do Gramofocas, mas a essa altura vai estar começando também o show do Pato Fu, com Música de Brinquedo, lá no Museu, daí eu corro pra lá de novo – e quando tudo isso acabar, eu vou na Mimosa Noite que acontece amanhã também lá no Arena.

Só que não, né, gente? Porque se eu fizer isso, o sábado que tinha tudo pra ser perfeito vai perder absolutamente todo o sentido.

Deixa eu acordar amanhã de manhã, sentir o clima do dia, ver o que ele me inspira e pronto: vou onde o vento me levar. Mas que é bom saber que a gente tem tanta opção de ser feliz, isso é.

Bora?
Dia do Patrimônio com Visite o Catetinho
Às 10h, no Catetinho, BR 040, Km 0
Entrada franca

Picnik na Funarte
Das 13h às 22h, na frente da sala Funarte, próximo ao Mané Garrincha
Entrada franca

Festival Sesi Bonecos do Mundo
A partir das 16h30 no Museu da República. Programação completa aqui
Entrada franca

Mimosa Noite anuncia a florada do ipê amarelo
A partir das 23h no Arena Futebol Clube
Setor de Clubes Sul, em frente ao Clube do Exército

Teatro, música, mundo, artesanato e sonho

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Primeira coisa: não é para só para criança. Teatro de bonecos, marionetes, mamulengos, fantoches – um universo rico demais para você achar que isso não é com você.

O boneco é desde sempre algo simbólico demais. Primeiro pela arte de quem o fabrica – quase sempre com poucos recursos, técnica improvisada e resultando numa expressão artística que já se justificaria em si, inanimada, como objeto.

Mas a isso se junta a intenção do artista: contar uma história, representar a pessoa, um povo, sua tradição – num processo lindamente próximo do que há de mais popular. Não tem jeito: pelo objeto, pela narrativa, pelo processo, por quem são as pessoas envolvidas, o teatro de bonecos sempre tem muito a dizer sobre de onde se vem, da cultura onde está inserido aquele grupo.

Por isso o Festival Sesi Bonecos do Mundo é a oportunidade de fazer uma verdadeira volta ao mundo por meio representações culturais todas. Tem espetáculos daqui mesmo de Brasília, de Pernambuco, do Rio Grande do Sul – e também da Itália, da Inglaterra, da Rússia, da Coréia.

Claro que, quando você chega lá e vê, é aquilo mesmo: uma historinha. Música, um enredo, olhos vidrados da plateia, bonecos com vida. Em que momento exatamente esses manipuladores ficaram invisíveis, mesmo se mostrando abertamente? – a gente se pergunta depois que acaba, porque na hora ficamos ali tão dentro da história que nem percebemos.

É isso. Historinhas do mundo, teatro para os pequenos – só que muito mais. Viagem imperdível para as crianças – e passaporte garantido para o mundo dos sonhos para os adultos dispostos a embarcar.

Bora?
Festival Sesi Bonecos do Mundo
Até domingo, 18 de agosto, ao lado do Museu da República.
Programação completa aqui.
Show do Pato Fu, com Música de Brinquedo, no sábado, 17 de agosto, às 20h30, no mesmo local. Tudo gratuito.

Talvez eu seja o último ultra-romântico

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Eu não gosto de filme que já na primeira cena eu adivinho o fim. Eu não gosto de música que eu adivinho a rima. Eu não gosto de quadro meramente figurativo – assim como não gosto de arte abstrata que não me diz nada. E principalmente eu não gosto de festa batida – dessas que tem todo final de semana, com as mesmas músicas, com a mesma galera, com o mesmo leiaute.

Deve ser por isso que eu gostei tanto da peça Ultra-romântico, do grupo Liquidificador. Porque na hora que abriram as portas do subsolo do Conic (ah, sim: começa que a peça era no subsolo do Conic) eu não tinha a menor ideia do que me esperava. Só isso já era bom – mas tinha mais.

A peça me deu de presente a constatação do eterno giro da roda do tempo, colocando a transgressão punk, underground e pós-moderna na perspectiva antiguinha e ingênua dos ultra-românticos. Ou seja: foi lindo. Trash, difícil, esquisito – mas (ou talvez por isso mesmo) lindo.

Por isso que venho aqui passar o chapéu, senhoras e senhores. O Ultra-romântico quer voltar ao subsolo do Conic este ano – e dessa vez, olha a ousadia, sem nenhum apoio de dinheiro público. Uma nova temporada totalmente financiada pelo público – que oferece de brinde para a cidade uma temporada de festas punks bem diferentes daquelas que você já enjoou de ir toda sexta-feira.

O catarse Ultra-romântico já está rolando, pelos próximos trinta dias. Nas contrapartidas pros colaboradores tem ingresso pra festa, camisetas e até a possibilidade de patrocínio de empresas.

Uma trupe pra lá de talentosa, gente se virando nos trinta pra conseguir grana, estética punk, um material de divulgação que é a cara dos zines que eu lia na adolescência, além da oportunidade de ouro de ter uma temporada toda de festinhas underground pra curtir: motivo de sobra pra você clicar aqui e ajudar a nova temporada do Utra-romântico a virar realidade.

Esta cidade aqui é sua

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Cheguei ao Catetinho revirando na memória a última vez que visitei aquele recanto de mata e águas cristalinas – me perguntando porque não fazia isso mais vezes. Mal sabia eu que não estava voltando ao ponto turístico mais bucólico, à primeira residência presidencial da nova capital, ao primeiro museu de Brasília: estava voltando no tempo.

Era um convite das meninas da Tríade para visitar a menina dos olhos delas: o programa educativo Visite o Catetinho, que promove, por meio do teatro e da música, um verdadeiro mergulho na história da construção de Brasília.

Os atores encarnaram Juscelino e sua trupe. A história da cidade é contada em um texto poético, metafórico, delicado – que é, ao mesmo tempo, alegre, animado, divertido. A turma do ensino médio que estava junto comigo não descolava os olhos da história que se desenrolava – dos meus, não nego, escaparam umas lagriminhas de emoção, saudade, orgulho ou outros sentimentos misturados não consegui definir (nem evitar).

Se eu tivesse que escolher uma palavra só para esse programa de educação patrimonial, seria: emocionante.

É inescapável para quem nasceu ou imigrou pra cá, inevitável para quem chegou ou é filho de quem chegou por aqui naqueles tempos: é a emoção de revisitar a nossa história familiar, a nossa história de vida, de tantas outras histórias aqui vividas. Histórias de tantos homens e tantas mulheres, igualmente e inegavelmente marcados pela construção de uma nova capital bem no coração do Brasil.

Acontece que sábado agora é o dia do patrimônio histórico, sabia? E as meninas da Tríade vão dar de presente para Brasília esse amontoado de emoções que eu tive o privilégio de sentir numa tarde quente de julho.

Porque mais do que contar uma historinha, mais do que emocionar os mais manteiga-derretidas, o que elas querem é conscientizar a gente. Fazer a gente entender esse sentimento lindo de ser parte de um patrimônio – algo que, bem contrário de uma “posse” irresponsável, exige amor, cuidado, preservação.

Esta cidade aqui é sua: é seu chão, é sua terra – de nascimento ou de adoção. Quando a gente tem essa consciência, todo o resto é consequência.

Bora?
Visite o Catetinho
Programa educativo em comemoração ao Dia do Patrimônio Histórico
Sábado, 17 de agosto, às 10h
Museu do Catetinho, BR 040, Km 0, retorno próximo à Polícia Rodoviária Federal
A Tríade oferece transporte gratuito com vagas limitadas saindo às 9h20 no Teatro Nacional. Reservas pelo telefone 3274-3971.

**E tem promoção: cinco lugares são pros nossos leitores! Quer concorrer? Deixa nome e email nas mensagens!**

A nossa primeira separação

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Eu tinha 22 anos quando me separei de você pela primeira vez. Foram seis anos longe, vivendo outra história, conhecendo outras pessoas. Seis anos que mudaram tudo: foi o tempo de sair do automático, de começar a te olhar te olhando e a prestar atenção no que importa – os detalhes.

Hoje eu entendo que nada foi mais importante para a nossa relação do que o afastamento. Sim, porque a nossa relação começou fácil demais. Eu me deixava levar, não achava a rotina ruim, nem boa, não costumava questionar as coisas. Era muito nova pra isso, tinha pouca experiência, nenhuma referência. E tudo ia bem, bem sem sal.

Foi preciso me afastar de você, Brasília, para me aproximar com mais verdade e mais presença. Não sei se vamos precisar de outra separação tão longa assim de novo. Mas, hoje, reconheço no afastamento-aproximação o movimento cíclico e permanente que não só vai, como deve nos acompanhar sempre, para o bem da nossa relação.

Reconheço esse processo nas minhas viagens de férias. Sair de você é tão importante pra mim quanto voltar pra você, porque hoje entendo que lugar nenhum do mundo me faz me sentir assim: em casa. E o afastar não precisa ser necessariamente geográfico. Pode ser um distanciamento de olhar, uma pausa para balanço.

Neste ano tive uma conversa com um lama budista que ficou em mim por muito tempo. Estávamos hospedados na mesma casa e abrimos uma cerveja antes de dormir (sim, lama bebe cerveja, mas só uma – ele é sábio). Estava filosofando sobre dúvidas existenciais, quando ele me chamou a atenção para o movimento de afastamento-aproximação, que é constante em toda e qualquer relação duradoura.

“É importante saber que o afastamento não é uma rejeição ao outro, pelo contrário”, ele me disse. Pelo contrário? Sim, pelo contrário. Em algum momento, é preciso afastar o olhar do outro e focar a atenção em si. O que vem depois, te garanto, pode ser muito melhor e verdadeiro. Viu, Brasília? Tenha um pouco de paciência com as minhas pausas. Eu vou, mas eu volto.